segunda-feira, 18 de março de 2024

COMUNICAÇÃO DE NICHOS VERSUS COMUNICAÇÃO DE MASSA

Na mundo digital vivenciamos, uma das maiores crises da comunicação, a era do consumo exacerbado de histórias, que tornam a realidade uma confusão, minando completamente o senso crítico dos cidadãos. Para entendermos isso, é imprescindível que saibamos o processo de construção da comunicação, antes das mídias sociais. Com o advento do impresso, rádio e televisão, a comunicação foi massificada, produzindo uma percepção uniformizada da realidade. Na era da televisão, por exemplo, havia um entendimento compartilhado da realidade que nos cerca. A comunicação estava concentrada na mão de poucos. As novas mídias, diferentes das mídias tradicionais, transformaram todos os cidadãos em formadores de opinião. A comunicação se tornou mais rápida e sem o intermedio dos comunicadores (jornalistas, apresentadores, ancoras) e filtros tradicionais. Na busca por audiência, ao invés de uniformizar ou massificar o público, nas plataformas digitais, os algoritmos têm a tendência de dividi-lo em nichos ou grupos, veiculando discursos que acentuam esta divisão. Sigmund Freud dizia que nada é mais poderoso para ligar um conjunto de pessoas do que encontrar adversários em comum dos quais falar mal. Percebendo essa tendência, mesmo que de modo não intencional, a maneira como os algoritmos funcionam hoje favorece a difusão de conteúdos que opõem um grupo a outro, pois são essas as mensagens que geram mais engajamento. Nesse processo, o “mundo comum” se fragmenta. A comunicação deixa de ser de massa e passa a ser feita por nichos, seguindo uma nova lógica. Essa lógica acabou segmentando a sociedade, polarizando-a, por meio de mensagens-chave falaciosas (fake news) disseminadas por novas personalidades. As personalidades que dominavam a lógica do rádio e da televisão, não são mais exclusivas, hoje elas dividem espaço com uma nova espécie típica das novas mídias: o influencer. Esse tipo de comunicação não tem o mínimo cuidado com posicionamento ético, apuração e investigação, não se preocupam com a verdade factual. A mídia tradicional responsável pela veiculação e regulação da verdade se vê ameaçada pelas mentiras disseminadas nas redes sociais, que passam a ser mais críveis que a verdade. Alguns grupos e influencers enaltecem a mentira e descartam qualquer verdade que possa abalar suas ideologias. Assim explica-se a influência e a ascensão da extrema direita em todo o mundo. O poder de convencimento e manipulação por meio do domínio das redes digitais explica a polarização da sociedade nos dias de hoje. Sendo assim, parece que o otimismo do filósofo, sociólogo e pesquisador em ciência da informação e da comunicação, Pierre Levy, está bem longe do que realmente estamos vivendo: “Não são as minorias que se opõem as mídias digitais, e sim as organizações, cujas posições de poder, os privilégios e o monopólio, sobretudo em relação a soberania sobre a construção de mensagens, discursos e significados encontram-se ameaçados pela emergência dessa nova configuração comunicacional." Na atual conjuntura, parece que estamos mais próximos do pessimismo do escritor, professor e filósofo italiano, Umberto Eco, falecido em 2016: “As redes sociais deram voz a uma "legião de imbecis", que antes não prejudicavam a coletividade.”